Coluna da Isa
Ainda estamos aprendendo a não fugir
Isabela Ferreira
13.04.2025

00:13 de um domingo. Essa é a hora exata em que estou com o celular na mão. A tela iluminando meu rosto como se fosse um holofote no meio de um palco vazio. Eu deveria estar com o celular desligado, imersa no filme que coloquei para relaxar. Um daqueles românticos, com trilha sonora suave e promessas de finais felizes.

Mas então, como sempre acontece quando menos espero veio ela: a inspiração.

Sutil, atrevida, e com timing duvidoso. Porque aparentemente, minha mente tem o péssimo hábito de florescer quando tudo ao redor pede silêncio. E lá vou eu…mais uma vez, transformar o caos da insônia e o sossego do domingo em palavras que talvez façam sentido só pra mim. Ou talvez, pra você também.

Essa última semana foi intensa. Daquelas que fazem você repensar se ser uma mulher ocupada e cheia de sonhos é realmente glamouroso ou só mais uma forma sofisticada de viver exausta com estilo. Entre um curso, eventos e metas que insistem em me encarar como se fossem juízes numa passarela de alta costura. Mesmo cansada, eu fui. Eu fiz. Eu entreguei. Porque quando você tem um propósito maior, o cansaço vira só mais um acessório. E no fim da semana, ainda que arrastando as pernas e com olheiras de edição limitada eu sigo, pronta pro próximo capítulo.

Essa semana foi atípica. Além da minha rotina já caótica, teve uma pequena discussão dessas que começam com uma frase atravessada e terminam com você questionando toda a sua existência.

Fiquei pensando no que foi dito, no que eu disse, no que eu não disse. E cheguei a uma conclusão incômoda: somos a geração traumatizada que traumatiza as pessoas.

Carregamos bagagens que não foram escolhidas, feridas que disfarçamos com bom humor e uma necessidade quase desesperada de sermos compreendidos mesmo quando nem nós nos entendemos.

Nosso afeto vem com manual, nosso amor com cláusulas, e nosso silêncio com um grito preso que ninguém ouve. Às vezes acho que estamos todos tentando amar com os pedaços que sobraram e torcendo pra que alguém veja beleza mesmo assim. E entre um treino, uma crise existencial e uma mensagem que eu não devia ter respondido, entendi que crescer dói. E se relacionar enquanto se reconstrói também.

Mas talvez o primeiro passo seja esse: reconhecer que somos obra em andamento. E que às vezes, amar alguém também é ter a coragem de não machucar mesmo quando a gente ainda está aprendendo a se curar.

E é engraçado como, mesmo com tanta informação sobre autocuidado, terapia, ciclos e cura emocional, ainda tropeçamos nos mesmos lugares. Queremos estabilidade, mas fugimos quando ela bate à porta. Queremos profundidade, mas nos perdemos no medo de sermos lidos demais.

Eu me vi ali, entre argumentos mal interpretados e silêncios que gritaram mais do que qualquer palavra. Tentei justificar minhas reações com todas as cartas da psicologia moderna, mas no fundo, só queria ser entendida. Só queria que alguém dissesse: “Eu sei que você está tentando.”

E sim, eu estou. Tentando ser mais leve. Mais justa. Menos reativa. Tentando não deixar que os traumas de ontem prejudiquem os encontros de amanhã.

É um processo. Um eterno ajuste de rota entre o que somos, o que queremos ser, e o que o mundo espera da gente. E no meio disso tudo, tem gente entrando, saindo, ficando ou simplesmente passando pra ensinar uma lição disfarçada de caos.

Hoje, eu escolho me perdoar por não saber lidar com tudo. E perdoar o outro por também estar tentando, à sua maneira, ser melhor do que já foi. Porque, no fim, talvez o segredo seja esse: reconhecer que não precisamos ser versões perfeitas pra merecer amor. Só versões reais com todas as falhas, mas com a vontade sincera de evoluir.

A verdade é que a nossa discussão não foi sobre quem estava certo ou errado. Foi sobre dois mundos tentando se encaixar sem manual. Duas pessoas com bagagens diferentes, tentando desembarcar na mesma estação.

E no meio de tudo isso, percebi: a gente não precisa estar completamente curado pra viver algo bonito. A gente só precisa de disposição pra ouvir, pra aprender, pra não fugir no primeiro desconforto.

Não somos perfeitos, nem prontos. Mas talvez sejamos exatamente o que o outro precisava encontrar agora. Um lembrete de que ainda dá pra sentir, ainda dá pra tentar e ainda dá pra acreditar.

E se no fim, tudo isso for só uma passagem? Que seja uma bonita. Que nos deixe melhores do que quando começou.

Porque o amor, assim como a vida, não precisa de garantias.

Só precisa de coragem.

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